sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Vida boêmia

Madrugada de quinta-feira e eu aqui acordada feito um zumbi.
Tive que inverter o dia pela noite, já que essa semana meus plantões são todos noturnos. Chego em casa às 8h30 da manhã, morta de cansada após 12h de trabalho pesado initerruptas. Aí não tenho escolha a não ser dormir o máximo de horas possíveis no dia. E quando tenho uma noite de folga, como hoje, tenho que ficar acordada porque senão, o plantão de amanhã seria muito mais pesado após um dia inteiro acordada...

Enfim, é bastante complicado. Mais complicado ainda porque a enorme maioria das pessoas fica acordada de dia (te ligando, fazendo barulho, gritando, ônibus na avenida...) e à noite elas dormem (restaurantes e supermercados fechados, ninguém com quem conversar, fome, muita fome!...)

Meu plantão de ontem, pelo menos foi regado a bife à parmegiana, batatas fritas e uma salada caprichada (que ganhei das sobras de meus residentes). Foi ótimo poder comer no meio do plantão! Mas, aí, depois passei fome do mesmo jeito porque perdi o horário do restaurante do hospital - dormi até às 14h30 (não pude dormir mais porque minha faxineira também é dessas que fica acordada de dia...) e o restaurante só fica aberto até às 14h. Comi umas bolachinhas, tive aulas e só fui jantar às 18h. Horrível!

Bom, mas deixa eu contar um pouco das pérolas do meu plantão passado:
** um homem, nos seus 30 e poucos anos, falou que um espinho de planta tinha entrado na perna dele. Fui olhar, tinha só uma escoriação e dava para sentir algo pontudo por baixo da pele. Avisei ele que provavelmente a gente ia ter que cortar a pele para retirar o espinho. Ele disse que era um espinho de uns 4cm, enorme. Preparei o material. E o cara começou a gemer feito criança: "você vai dar anestesia, né doutora?! Não, porque senão eu não vou aguentar... Ai, você vai enfiar ESSA agulha deeeeesse tamanho???? Não, doutora, pelamordedeus..." E choramingou até...
Bizarro!
Aí então eu fiz lá a minúscula cirurgia e saiu um espinho de 1,5cm. Um trocinho ridículo de pequeno. Até achei que tinha mais, que a ponta devia ter quebrado e só saído ela. Chamei meu chefe, a gente cutucou, cutucou, cutucou e não encontrou nada. Era aquilo mesmo.
A sorte do cara é que estava saindo secreção e meu chefe achou melhor não dar ponto nem nada, deixar aberto. Porque se tivesse que dar ponto nesse cara... ai ai...

** chegou um cara, jovem, com uma camisa enrolada no braço, toda ensanguentada. Meu colega foi perguntar o que tinha acontecido, o paciente respondeu:
- Eu bati o braço num vidro, doutor.
- Mas como assim bateu o braço? Era um vidro quebrado? Onde estava esse vidro?
- Era um vidro desses que ficam no teto. Tipo que tem na entrada de hotel chique, sabe?
- Mas como é que você bateu o braço num vidro que fica no teto?
- É que eu cai.
- Caiu? Como assim? Onde você estava? Caiu de onde?
- Ah, doutor, eu estava num apartamento em cima de uma escada e caí pela janela em cima de um desses vidros que fica no teto, ele quebrou e cai em cima de outro que também quebrou e aí eu caí no chão do térreo.
- Então você caiu de uma altura grande e quebrou 2 camadas de vidro nessa queda?
- É. E bati meu braço no segundo vidro e cortou e tá sangrando.
Meu colega, assustadíssimo, saiu correndo, chocado com a história do cara e foi em busca de uma maca, monitor, colar cervical etc. Afinal, o cara tinha caído de uma altura de uns 12 metros. Queda grave, acidente sério e necessita atendimento de urgência.
(um rapazinho, que chegou um pouco antes, caiu de uma altura de 10 metro, quebrou as duas pernas, teve hemorragia intracraniana e estava beirando a morte lá na emergência)
Quando meu colega foi ver o que tinha embaixo da camisa ensanguentada, viu uma lesão super profunda (dava para ver o osso), grande, sangrando bastante.
E o cara só vinha reclamando que bateu o braço no vidro... Inacreditável!



Só para contar uma pequena vitória:
** Às 5h30 da manhã, quase no fim do plantão, eu estava me arrastando. Eu estava super hiper mega cansada, mal aguentava andar, minhas costas em frangalhos. Virei para minha amiga e falei "tô morrendo!". Ela respondeu: "acabou de chegar uma ficha e a paciente está aqui" e apontou para o meu lado direito. Tinha uma paciente curvada de tanta dor abdominal, ao meu lado. Eu não a vi e ainda fiz esse comentário idiota com ela ali, ouvindo eu e minhas reclamações de menina fraca.
Peguei a ficha, levei a mulher até a sala e a atendi. Achei que eu não estava em condições de atender bem ninguém, pelo cansaço, pela hora, por tudo que eu já tinha feito naquele dia interminável.
Mas eu atendi a mulher muitíssimo bem. Fui bastante atenciosa, ouvi, discuti o caso com rapidez, consegui reavaliar as possibilidades, o que seria ou não melhor para ela. Foi ótimo. E acho que ela ficou bem feliz de me ter como médica.

Um comentário:

Bruna disse...

Incrivel! Isso tudo parece filme... Estou adorando este blog!