quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Rito de passagem

O dia de hoje marca para mim um momento de transformação, minha "promoção", a passagem da classe baixa para a classe alta.
É estranho demais viver isso. Principalmente porque todas as pessoas que fizeram parte da maioria da minha vida continuam na classe baixa, falam aquela língua, frequentam aqueles lugares. Realidade que para mim apresentasse distante agora.
Me sinto mais diferente dos meus pares e mais iguais a meus ímpares. Me sinto meio que sem limites, vivendo um sonho, uma posição que eu nunca imaginei que poderia atingir.

Se você não está entendendo bem do que eu estou falando... a culpa é minha e não sua.
Explico:
Saí hoje para escolher um vestido para minha formatura. Eu tinha visto um vestido maravilhoso, perfeito num desfile na tv. Sabia que ele custava caro mas não tinha noção do que "caro" significava.
Lá de onde eu vim, não existe a possibilidade de comprar roupa por mais de R$100,00. É um absurdo! Inimaginável! Simplesmente não dá pra bancar e não fazemos isso.
Quando comecei a pensar no vestido de formatura que eu iria comprar, conversei com algumas meninas de uma classe social semelhante a minha. Elas me disseram que um vestido não sairia por menos de R$300,00 ou 400,00. Passado o susto, me acostumei com a idéia de gastar tal quantia.

Conversando com outras pessoas, investigando mais a fundo, descobri que a maioria (que obviamente pertence à classe alta) paga cerca de R$1.500,00. Fiquei chocada! De verdade! Nunca aventei a possibilidade de gastar tanto dinheiro numa roupa. Pior ainda, num vestido pra ser usado uma única vez, provavelmente. Óbvio que pensei "nunca que vou pagar tanto por um pedaço de tecido".

Enfim, hoje, saí com minha madrinha, minha irmã e duas amigas (ricas) da faculdade e fomos a procura do dito cujo.
A primeira loja que visitamos foi aquela em que tinha o vestido que eu tinha amado, aquele que eu sabia que seria caro mas que não tinha idéia do preço (achei que era uns R$1.000,00 e estava decidida que só iria experimentar porque procuraria em outras lojas algo mais de acordo com minha realidade).
Só que, quando coloquei o dito cujo (ainda sem saber o preço), ficou simplesmente divino, perfeito, maravilhoso. Sem necessidades de ajustes nem nada. Parecia que tinha sido feito para mim, sob medida (Repare no discurso patricinha).
Perguntei o preço e quase cai dura. Era muito muito muito caro. Muito mais caro do que eu podia imaginar. Eu nunca pensei em sequer segurar na minha mão uma roupa com tal valor. Era uma facada! Um absurdo major!

Fiquei em estado de choque, enquanto minha madrinha passou a negociar o preço e em quantas mil vezes ela poderia pagar aquele troço. Eu não conseguia conceber a ideia de pagar tanto por qualquer coisa que fosse, muito menos por um vestido. Eu dizia e repetia "eu nunca paguei nem R$100,00 num tênis, eu nunca usei um tênis que custasse R$100,00, como posso pagar tanto por um vestido".

Bom... no fim... acabei comprando (com a pressão da madrinha, da irmã e das amigas). Gastei todo o dinheiro que tinha, mais o dinheiro que minha madrinha tinha, parcelei o resto em 10 vezes e agora preciso arrumar um empréstimo ou um "presente" da minha vó pra bancar tudo.

A grande questão dessa história é que não estou preocupada. Eu nunca na minha vida tinha feito uma compra parcelada. Detesto cartão de crédito, não acho interessante fazer dívidas pro futuro sem saber se sequer estarei viva.
Hoje fiz minha primeira.
Mas não estou preocupada mesmo.
E minha falta de preocupação vem do fato que sei que esse montante de dinheiro que hoje pra mim parece infinito, ano que vem não será nem cócegas.
Se eu der plantão no Natal e Ano Novo (dias de maior valor) já dá pra quitar essa dívida e ainda sobra.
Não estou preocupada porque a partir de dezembro, passo a poder dar plantões e por cada um deles (por 12h de trabalho) ganharei mais do que eu ganhava num mês inteiro de "camelação" quando eu era auditora de shopping.
Vou ganhar uma quantidade de dinheiro que não sei o que exatamente significa, que não tenho idéia de como alguém pode gastar tanto num único mês. Vou conseguir comprar meu carro zero, viajar pra NY, passar um mês na Europa. Vou poder fazer tudo e mais um pouco e ainda vai sobrar. Vai sobrar pra caramba.

As pessoas dizem que médico ganha pouco. Mas isso depende muito do referencial.
Se você considerar o tanto que a gente estudou e estuda para nos mantermos bons, se considerar o envestimento que fizemos e todo sofrimento pelo que passamos... ganhamos sim, muito pouco.
Mas eu, com as referências de salário que tenho, tendo vivido o que vivi, tendo passado as dificuldades que passei... para mim, é bastante dinheiro. É dinheiro suficiente pra eu me tornar a pessoa mais rica entre todos os meus familiares/parentes, pra me tornar a aluna mais bem sucedida de qualquer dos colégios que estudei...
É dinheiro suficiente pra realizar todas as minhas vontades, as da minha irmã, da madrinha e mais algumas...
É simplesmente uma nova vida. Totalmente outra.

O problema vai ser quando eu me acostumar com essa "riqueza" e começar a me comparar com meus, então, pares. Quando eu começar a sonhar mais alto - ex.: um apartamento no Jardins...