quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Identidade

Hoje tive uma crise das brabas.
Na verdade, a crise começou há alguns dias - estava me sentindo mal, tive uma enxaqueca monstra de 2 dias sem melhora com analgésico - sinal que algo estava errado.

Enfim... ontem fui à aula na faculdade. Ao sentir os ares do local, tive um momento de epifania e percebi que eu não queria (nunca quis) voltar para aquele mundo de egos.
Onde eu estava com a cabeça quando decidi prestar residência de Radiologia? Justo Radiologia onde há tantas "plataformas" e egos insuflados...

Mas tudo tem um contexto.
Algumas pessoas reclamam que mudo muito de idéia. De fato. Mudo mesmo. Mas mudo porque a realidade muda, porque os fatos que me são apresentados mudam. E, principalmente, mudo muito de idéia porque ainda não me encontrei.

Quando estava trabalhando no posto, cheguei a pensar em fazer aquilo por 3 anos, fazer um curso de especialização, tirar título de especialista e seguir a carreira. Eu até que gostava daquela vida, dos atendimentos. Eu não gostava muito das pessoas incompetentes, das dificuldades do sistema, de ver pacientes esperando um exame ou uma consulta de especialista há meses... Mas o dia-a-dia da profissão, me era recompensador
.
Há  11 anos, após alguns meses de cursinho, eu não fazia idéia de que faculdade fazer. Minha psicóloga um dia me pergunto: "imagina daqui há 10 anos, o que vc se imagina fazendo?". A primeira imagem que veio na minha cabeça foi a da minha Pediatra. Atender pacientes num consultório. Eu queria ser médica. Essa idéia caiu como uma luva quando considerei que era um vestibular difícil e, portanto, eu iria demorar um pouco pra conseguir passar (o que naquele momento seria bom pra mim por não ter certeza do que queria), além do desafio enorme - coisa que sempre me atraiu.
Mas, fundamentalmente, fui ser médica pensando em ter um consultório.
Durante a faculdade, descobri, a duras penas que não seria possível ter um consultório, muito menos como Pediatra. Consultórios particulares só são possíveis hoje para médicos com muitos anos de carreira, muito conceituados ou para filhos desses médicos.
A mais duras penas ainda, trabalhando com PSF, descobri que não gostaria de ter um consultório de Pediatria. Puericultura cansa por causa das mães (que ou são muito cuidadosas e se tornam chatas ou são muito descuidadas e tenho vontade de acionar o conselhor tutelar).
De qualquer forma, o PSF foi o lugar que me proporcionou chegar mais perto daquela minha idéia inicial de ser médica. Aos trancos e barrancos, eu gostava daquela vida (apesar de eu sempre dizer que nunca gostei de ser médica, na verdade, algumas vezes gostei sim - foram poucas mas gostei).

Acabei saindo por problemas sérios de relacionamento com o gerente e com as enfermeiras.
Ao me ver novamente no mundo dos médicos "desempregados", tive que arrumar uma forma de me sustentar. E aí veio a idéia de voltar a estudar, fazer residência.
No início, dei plantões - e, desesperadamente, descobri que isso não é vida pra mim. Sofria tanto e só conseguia enxergar a residência como saída dessa vida de médica mal preparada.
Mas, aí, numa reviravolta muito esperada, consegui alguns plantões em ambulatórios de shopping.
E me adaptei totalmente a esse trabalho. Baixa complexidade, tranquilo. Paga pouco mas também não traz estresse. Colocando na balança, começou a valer muuuuito a pena pra mim.

Ao me sentir adaptada a esse novo trabalho, comecei a me questionar quanto a residência. Não sobre não mais prestar, mas sim sobre o que prestar.
Tinha decidido a Radio porque não tem muito contato com pacientes, ganha bem, não tem muita encheção de saco com equipe e acompanhantes. Parecia uma boa opção lógica, considerando minha necessidade de um emprego mais adequado do que plantões.
Mas agora que estou adaptada com um trabalho (que é temporário mas pode, sem problema, ser meu trabalho por mais algum tempo), comecei a repensar no que eu quero para minha vida, nos meus sonhos, em quem eu sou.

Eu não nasci pra ficar à margem da sociedade, numa sala escura mexendo num computador o dia todo. Eu não nasci pra ser passiva. Eu gosto de ter ideais, de dar meu sangue por eles, de fazer diferença. Eu não seria feliz sendo radiologista, eu acho...

Por outro lado, de repente me dei conta que se eu fizesse residência em Medicina de Família, estaria mais próxima do que eu sou, dos meus ideais. Trabalhar com Saúde Pública, atuar no SUS, no meio dos que pensam saúde no país. Poderia ser alguém mais atuante, poderia manter minhas utopias e continuar lutando para que algo melhorasse no SUS. É isso que quero pra minha vida. Fazer a diferença. Foi pra isso que trabalhei anos no Centro Acadêmico, que estudei todas aquelas histórias da Medicina no Brasil, que participei de tantas reuniões. E acho que sim, ajudei a melhorar o ensino de Medicina na minha faculdade. Talvez muito pouco, mas ajudei. E adorava sonhar isso, tentar, ter idéias, pô-las em prática. E nessa área não há tantos egos, há muito mais gente utópica como eu, inclusive muito dos meus amigos e pessoas que eu admirava na faculdade, seguiram essa área.

Pois é... agora já não dá mais pra mudar a opção pra prova desse ano. Se eu passar, vou começar a fazer e ver no que dá. Talvez a imagem que eu tenha da Radio esteja errada.
Se eu não passar, terei mais um ano inteiro pra pensar nessas coisas, nesses ideais.

Quem sabe...







sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Algo errado


Tem alguma coisa errada comigo. Ou será que é com o mundo?

Ontem, o planeta recebeu a notícia da morte de Muamar Khadafi, ex-ditador da Libia. Diversos canais mostrando fotos e vídeos do corpo (vivo?) sendo arrastado pelas ruas, ensanguentado, como um troféu.
Os comentários vinham no sentido de “agora a Líbia está livre”. Dirigentes da ONU, presidente dos EUA, secretária de segurança, todos comemorando a morte do ditador.

De verdade, não consigo entender.
O cara era um ditador. Ok. Os chamados “rebeldes” já haviam derrubado ele do governo há algumas semanas. Mas, isso não bastava, queriam que ele morresse.
Num mundo que eu chamaria de civilizado, o cara seria preso junto com os seus pares (que também mataram e mandaram matar), seriam julgados, condenados, teriam que devolver tudo que roubaram (que não deve ser pouco, baseando-se no palácio onde ele morava) e assim seguiria a história.
Mas não. Matam o cara e mais dois homens de sua corja. Levantaram o troféu em praça pública. E todos comemoram. Comemoram a morte dele. 
Mas tudo que ele fez e tudo que roubou continua por aí.
No fim das contas, ele saiu no lucro. Morreu. Acabou.

Isso está certo? É assim mesmo que deve acontecer? É nesse mundo de carnificina que queremos viver?

Achei que eu estava ficando louca, que eu era uma ignorante, que não estava entendendo nada do que estava acontecendo por falta de conhecimento mesmo.
Até que ouvi um pronunciamento da Presidente Dilma, dizendo que apoia a transição democrática da Libia mas não comemora a morte do ditador. 
Ufa!

Não sou petista (tenho diversas restrições a esse partido, pra dizer a verdade), nunca fui a favor da Dilma como presidente. Mas me sinto aliviada de ouvir que nossa dirigente compartilha da minha opinião. 
Mesmo sendo poucas vozes, ainda acredito que somos as mais sensatas.

Só pra deixar claro, não critico os tais "rebeldes", os Líbios, que sofreram por 40 anos nas mãos de Khadafi. Que queriam vingança, que necessitavam se ver livre da imagem daquele que os fez tanto mal. 
Critico sim a postura ridícula dos chefes de estado, principalmente desse que dizem ser o homem mais poderoso do mundo. Mais poderoso??? Com essa visão simplista de que com a morte de um cara tudo está resolvido, todo mal está acabado??? 
Algo está errado no mundo...

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Acabei de fazer a prova do ano passado (pra testar como vão as coisas após esses meses de estudo).
Fiz 5,9 pontos.
5,9...
Com essa pontuação não consigo passar nem na porta do hospital....

Aliás, até consigo... passar pra dentro do PS, como paciente, com diagnóstico de demência!!!
Frequentemente vejo críticas a médicos (da imprensa, de pacientes, de acompanhantes), dizendo que eles não dão a devida atenção aos pacientes, que não atendem casos graves com a rapidez necessária, que deixam a pessoa agonizando numa sala de espera, sem dó, entre outras.

Como em qualquer lugar e qualquer área profissional, há bons profissionais e maus profissionais. Claro!
Vamos aqui considerar apenas os bons.

Muitas vezes, o que as pessoas consideram grave ou "urgente" não é nem de perto grave e urgente para a Medicina. Condutas médicas são criticadas muitas vezes porque não se conhecem os fundamentos da questão.

Atualmente dou plantões em shopping. Simples, tranquilo, pré-hopitalar.
A maioria dos atendimentos é de funcionário que não tá afim de trabalhar ou de clientes querendo chamar atenção (geralmente do ex-marido - elas ligam desesperadas pra eles virem buscá-las com a desculpa que o filho deles está sozinho e ela "está morrendo").
Agora a pouco atendi uma gestante, queixando de falta de ar intensa e dor nas costas. Sua colega mega preocupada, achando que a gestante estava muito mal, que era urgente, que eu precisava fazer alguma coisa.
Fui examinar a criatura. Estava tremendo, forçando respiração rápida, mexendo as mãos como se estivesse em desespero. Exame pulmonar e cardíaco totalmente normal. Saturação ótima, pressão ótima. Tudo perfeito. Mas a mulher tava lá balançando as mãos e hiperventilando.

Comecei a conversar com ela, dei um analgésico, um pouco de atenção, pedi pra colega chamar o marido para buscá-la, deixei ela sentada no consultório e... assim milagrosamente... a mulher melhorou 100%.
Quando ia reavaliá-la, perguntar se ela estava melhor, ela dizia que sim, dava umas hiperventiladas, tremia um pouco as mãos e só.
Ela só queria mesmo que o marido (coitado) saisse do trabalho e viesse buscá-la.

Ok.Ok. Não posso julgá-la.
Mas, de boa, fala se isso não é muito complicado de aceitar. A babaca da colega queria que eu saisse correndo, enfiasse a menina na ambulância pra levá-la pro hospital, falando comigo como se eu fosse a pessoa mais fria e maldosa do mundo por deixar a gestante deitada na maca descansando quando o que ela precisava mesmo era de "um exame de hospital".
Ahhh, faça-me o favor.

Agora, com um pouco mais de sangue frio e paciência (adquiridos depois de muito apanhar da vida médica), consigo simplesmente ignorar os pitis de acompanhantes. Respiro fundo, tento explicar. Se a pessoa não quer ouvir, simplesmente viro as costas e saio. 
Aí a pessoa começa a me xingar, fala pra todo mundo perto que eu sou a pior médica que ela já viu, que "vai ver" eu não sou nem médica e estou na verdade usando registro de outra pessoa... entre outras babaquices.
C'est la vie!
Falta pouco para prova.
E só consigo pensar em outras coisas.

É cada vez mais difícil estudar. Sei que falta muita matéria, mas estou de saco cheio.
Sei que preciso passar pra continuar minha vida, mas... ah... é muito chato.
Mais chato ainda ter que estudar pra passar numa prova de uma carreira que nem sei se quero... que nem sei se vou gostar....

Tá complicado.