Vi nos telejornais, li nos jornais, ouvi comentário sobre a notícia dos estudantes de Medicina da UEL que invadiram o PS para fazer baderna por estarem se formando.
Sinceramente, quando ouvi a notícia minha primeira sensação foi de compaixão. Senti que eu poderia ser vítima dessa acusação, senti que eu e meus colegas poderíamos ter feito a mesma coisa.
Não porque a gente não respeite o paciente, não porque não temos noção do que é um pronto-socorro, que as pessoas que estão lá estão doentes, precisando de cuidado. Mas porque na nossa vida de interno a gente passa tanto tempo no hospital que perdemos a noção do que aquele lugar significa para as pessoas.
Durante o internato passamos por situações tão difíceis, somos por vezes humilhados por nossos professores, constantemente vemos situações de desrespeito à ética médica e temos que ficar calados (ou falamos e ninguém ouve ou dá importância). É tanta pressão, é tanto sofrimento, que perdemos a noção de realidade.
Deve ter sido um alívio tão grande para aquelas pessoas se formarem, saber que não precisarão mais passar por todo aquele sofrimento (apesar de que a Residência não é muito melhor)... que passaram dos limites na comemoração.
Eu não sei o que aconteceu naquele PS. Eu não estava lá, não conheço o lugar nem as pessoas e não posso dizer. Sei que, de qualquer forma, foi um absurdo esses quase médicos fazerem isso. Inadmissível e merece punição.
Mas, por outro lado, consigo compreender. Consigo me colocar no lugar deles e entender o que aconteceu, por que fizeram isso. Sem dúvida um desrespeito aos pacientes, à Medicina, à moral e à ética. Mais um entre tantos que vemos e vivemos diariamente como estudantes de Medicina.
Fico me lembrando das tantas vezes em que parei com meus colegas de panela no meio do corredor da enfermaria para combinar uma balada, rindo alto e brincado... com tantos doentes ali em volta, tantos familiares sofrendo.
Fico me lembrando de ontem quando, aguardando o professor, sentamos na sala de espera do ambulatório e ficamos conversando sobre besteiras, dando risadas, zuando, com diversos pacientes por perto, nos olhando, incomodados.
Não acho que esses pequenos atos que todos nós estudantes de Medicina, diversos médicos, enfermeiras, auxiliares de limpeza do hospital cometemos sejam muito diferentes desses atos que esses rapazes e moças fizeram.
Perdemos a noção do que é um hospital. Passamos tanto tempo lá dentro que não notamos pequenos ou grandes atos de desrespeito diários.
Esse comportamento reflete ainda algo muito mais profundo e complexo. Além de traduzir a pobre formação em ética que temos (não a teórica, mas a de exemplos; nos ensinam na base do "faça o que falo mas não faça o que faço" e, claro, não dá certo!), o excesso de trabalho, as humilhações que sofremos, a falta de suporte para nossos momentos de dificuldade... esse triste fato reflete ainda a realidade em que se encontra o HU de Londrina e o curso de Medicina (um dos melhores do país). Para saber sobre isso, leia essa denúnica publicada no "O Globo".
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