"O que não enfrentamos em nós mesmos encontraremos como destino." Carl Gustav Jung
domingo, 21 de dezembro de 2008
"A elegância do ouriço"
Há alguns meses, ao entrar na sala de minha madrinha, ela me diz: "Acabei de terminar um livro sensacional que me fez lembrar muito de você". Se virando, ela pega "A elegância do ouriço" e lê para mim o seguinte trecho:
      "Sabem o quê? Pergunto-me se não deixei alguma coisa escapar. Um pouco como alguém que teria más amizades e descobrisse outra via ao encontrar alguém bom. (...) Então, eis o que senti: ao ouvir a sra. Michel e ao vê-la chorar, mas sobretudo ao sentir o quanto lhe fazia bem me dizer tudo aquilo, compreendi uma coisa: compreendi que eu sofria porque não podia fazer bem a ninguém ao meu redor. Compreendi que queria mal a papai, mamãe e sobretudo Colombe porque sou incapaz de lhes ser útil, porque não posso fazer nada por eles. Eles estão muito longe na doença, e eu sou muito fraca. Vejo direitinho os sintomas deles, mas não sou competente para curá-los e, com isso também fico tão doente quanto eles mas não vejo. Porém, ao dar a mão à sra. Michel, senti que eu também estava doente. Em todo o caso, o que é certo é que não posso cuidar de mim punindo aqueles a quem não posso curar. (...) tenho vontade de deixar os outros me fazerem bem: afinal de contas, não passo de uma menina infeliz, e, mesmo sendo extremamente inteligente, isso não muda nada na situação, não é? Uma menina infeliz que, no pior momento, tem a sorte de fazer encontros felizes. Tenho moralmente o direito de deixar passar essa chance?
      Bah. Sei lá. Afinal, essa história é uma tragédia. Há pessoas valorosas, regozije-se!, tive vontade de dizer para mim mesma, mas, pensando bem, que tristeza! Eles acabam debaixo da chuva! Já não sei muito bem o que pensar. Por um instante, acreditei que tinha encontrado minha vocação; acreditei entender que, para me cuidar, precisava cuidar dos outros, quer dizer, dos outros "cuidáveis", os que podem ser salvos, em vez de ficar dando voltas porque não posso salvar os outros. Então, será que deveria ser médica? Ou escritora? É um pouco parecido, não é?
      E além disso, para uma sra. Michel, quantas Colombes, quantos tristes Tibères?"
Na época, não entendi, mas resolvi comprar o tal livro. Afinal, se minha madrinha estava tão encantada com aquele livro, devia ser bom.
Hoje, após terminá-lo, entendi tudo. Entendi muito.
De certa forma, ele traduz nossa relação, como ela se criou, em que ela se baseia.
Essa mulher que cito aqui, não é minha madrinha de verdade, nunca me batizou nem nada. Ela é uma funcionária da faculdade em que estudo. A conheci quando estava no 1º ano e, desde então, nossa relação se fez profunda e inexplicavelmente. (Nos adotamos: madrinha e afilhada.) Nos identificamos, nos completamos.
Assim como as duas personagens principais do livro.
E tantas coisas nesse livro se remete a nós, a nossa relação... Tantas... Até parece que fomos nós que o escrevemos...
Retiro dessas semelhanças, a inteligência das personagens. Nem eu, nem ela temos essa cultura, essa inteligência privilegiada. Mas temos alguma sensação estranha em relação ao mundo, uma estranheza que não sabemos de onde vem. Não concordamos com o mundo em suas convenções e misérias (o que chamamos de miséria, não é de forma nenhuma aquilo que as outras pessoas entendem assim). Não sei explicar... é como se percebêssemos nas pessoas algo que os outros não percebem... e nos sentimos isoladas, diferentes, incompreendidas... sei lá.
Toma conta de mim nesse momento, uma felicidade indescritível, incomparável. Saber que ela se nomeia minha "sra. Michel" e que eu sou sua "Paloma"... ah...
Encontro.
Intenso.
Imperfeito.
Eterno.
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