Mais um estágio termina. E com ele, o semestre.
Esse foi, sem dúvida, meu melhor mês da faculdade até agora. Pela primeira vez me senti médica, fiz coisas que médicos fazem, assumi responsabilidades, procedimentos... Não aprendi quase nada teórico, como esperava. Mas passei um mês numa enfermaria aprendendo o que é ser médico.
- Aprendi a colher sangue e finalmente perdi o medo. Colhi gasos (ainda não com muito sucesso, mas já saberia me virar). Passei um cateter central direitinho (até o último dia do estágio ouvi elogios por isso).
- Aprendi que não se deve dar boas notícias precocemente. É sempre melhor preparar para o mal (mesmo quando você sabe que a probabilidade é pequena). Eu já sabia isso na teoria, mas quando me deparei com a situação de conversar com uma família, acabei metendo os pés pelas mãos. Duas vezes seguidas.
- Aprendi que não sou boa em reconhecer a piora dos pacientes. Tenho tendência de achar que eles estão sempre melhores. Tenho a tendência de suprimir meu sexto sentido que diz que algo não vai bem e fechar os olhos. Meus colegas acham que isso se aprende com o tempo e a experiência, mas eu acho que não é um aprendizado, mas sim uma capacidade. Capacidade de lidar com meu próprio medo do que está por vir, lidar com a frustração de saber que nem tudo está indo tão bem quanto eu gostaria.
Uma das minhas pacientes ontem estava com muita falta de ar. Mas ela sempre esteve com falta de ar. Alguma coisa me dizia que dessa vez era diferente. Tive medo. Suprimi. 2 horas depois ela estava na UTI. Péssimo. Tenho um pressentimento de que ela não sairá mais de lá. Tomara que eu esteja errada de novo.
Fui ao quarto de uma outra paciente hoje. Achei ela diferente, estranha. Mas suprimi. O exame físico estava normal, não tinha queixa, exames lab normais. À tarde passei lá pra vê-la e fui informada que ela teve um TEP. Ainda não consegui processar essa informação. Não consigo aceitar/acreditar. Mas sei que é totalmente possível e provável. Ela tinha todos os fatores de risco e mais um pouco. Todos os cuidados que tomamos não foram suficientes... e eu não consegui processar a informação da possibilidade e da percepção para diagnosticar.
Mas continuando com os acontecimentos do mês:
- Briguei com um dos meus melhores amigos. Ele fez a cacada, não teve coragem de assumir, quase me prejudicou por isso e ficou magoado porque dei uma baita bronca nele. Ele simplesmente não fala mais comigo, apesar das minhas tentativas frustradas de contato. Acabei desistindo. Acabei me cansando de ser ignorada e parei de tentar falar com ele. Aí, acho que ele se arrependeu e não soube mais como voltar a falar comigo sem ter que tocar nesse assunto. Agora estamos nesse ponto. Ninguém sabe como fazer parar. Nenhum dos dois sabe como deixar passar sem mais mágoas.
- Me apaixonei (mas essa história fica para o próximo post)
- Convivi com homens lindos, inteligentes, médicos e comprometidos... que estavam no cio. Eles não podiam ver uma mulher bonita que já ficavam todos se contorcendo, fazendo comentários escrotos. Eles nem ligavam que eu estava presente. Homens são simplesmente homens.
- Fiquei sabendo que sou comum. Ou tenho um rosto comum. Primeiro, começaram a me confundir com uma residente da minha equipe. Depois, as equipes todas começaram a me chamar de Inezinha, dizendo que eu era a cara de uma outra residente. Até chegar ao cúmulo de pararem uma "convenção" porque sentei do lado dela e todo mundo se impressionou com a semelhança. Simplesmente o anfiteatro inteiro parou para comentar. E hoje, para terminar, algumas enfermeiras que estavam comentando que eu era muito parecida com a Luciana (???), disseram que tenho um rosto comum.
O que me tranquiliza é que as duas residentes com quem me confundiam são consideradas muito bonitas pelos meus residentes no cio.
- Confirmei a importância das enfermeiras para nossa profissão. Se não fossem elas teríamos demorado muito mais para diagnosticar algumas intercorrências. Diagnosticaríamos e trataríamos da mesma forma, mas talvez num momento de maior gravidade. Teve um dia que a enfermeira veio pedir para olharmos o dreno de um paciente de 1º PO. Ela disse que estava hemático, perguntou se já tínhamos visto. Os residentes: "Imagina, tá sero-hemático, a gente acabou de olhar, não exagera e pára de assustar a gente, vai!". Ela insistiu, pediu que eles fossem lá ver de novo... O rapaz simplesmente tinha tido uma hemorragia interna naquele instante. Foi reoperado no mesmo dia. Grave.
No outro dia, a outra enfermeira veio me dizer que minha paciente estava rebaixada. E eu: "imagina, ela não tá não, falei com ela agora pouco e ela estava normal". E ela insistiu, pediu que eu fosse lá ver de novo. Óbvio que ela estava rebaixada. Toda a razão para as enfermeiras tão pouco valorizadas.
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