(copiado do meu outro blog Minha versão)
Um Domingo antes de minha mãe falecer, meus tio-avós vieram de Belo Horizonte para visitá-la no hospital. Eles estavam animados pois não a viam há alguns anos e estavam com muitas saudades. Eles chegaram na casa do meu pai, às 7h da manhã e combinamos de sair às 11h (a visita era a partir das 12h).
Cerca de 10h, o telefone tocou, eu atendi:
- Por favor, quem está falando?
- Com quem você gostaria de falar (Eu raramente falo meu nome antes de saber com quem estou falando)
- Você é parente da dona Cecy?
- Sim, sou filha dela. Por quê? Aconteceu alguma coisa?
- Meu nome é D... sou aqui do hospital, estou ligando para informar que hoje, cerca de 9h da manhã, o quadro da Dona Cecy se agravou e os médicos pediram para que viesse algum parente dela aqui para eles conversarem...
- Hum - Pausa para eu me recuperar do choque - Já estamos indo
Fiquei desesperada. Corri atrás do meu pai, contei para ele, ele contou pros meus tios, nos arrumamos correndo...
Eu achei que tinha sido algo muito grave mesmo, que ela havia morrido, sei lá. Só conseguia me lembrar da moça falando "hoje, cerca de 9h da manhã, o quadro da dona Cecy se agravou". Por que ela deu o horário? Por que não falou o que tinha acontecido?
Eu pedi para que minha irmã fosse com a gente, queria que ela estivesse do meu lado, que ela me abraçasse quando eu precisasse - e eu disse isso a ela... Mas ela não quis. Ela falou que não gostava de ver minha mãe mal, que não queria vê-la daquele jeito. Nem se importou comigo, simplesmente bateu o pé e disse que não sairia de casa. OK.
Saímos eu, meu pai e meus tios. Ao chegar no hospital, não podíamos subir todos, apenas eu (que tenho crachá) e mais 2 acompanhantes - meu pai e meu tio (deixamos minhas 2 tias lá em baixo esperando).
Subimos, passamos em frente ao posto de enfermagem:
- Oi Eliane (a enfermeira chefe)
- Ah... oi, que bom que vocês chegaram... ela está lá no quarto. Estamos esperando a maca para levá-la para UTI. Já vou chamar o médico para vir conversar com vocês.
Entramos no quarto. Ela não estava tão mal quanto fizeram parecer. Estava tranqüila, falando normalmente, só estava com um pouco de mal estar. Ao ver meu tio, ela ficou muito emocionada, perguntou o que é que ele estava fazendo aqui em São Paulo...
Vendo que já iam levá-la, meu pai resolveu descer com meu tio para que minhas tias pudessem subir. Mas eu não queria ficar lá sozinha, eu não queria conversar com o médico sozinha porque eu sabia que não faria todas as perguntas que meu pai gostaria e não saberia passar as informações para todos depois. Pedi para meu pai ficar comigo, mas não tinha jeito. Ele pediu para que eu o chamasse assim que o médico chegasse e desceu.
Trouxeram a maca, os enfermeiros começaram a arrumá-la para levá-la. Pedi para que esperassem pois minhas tias já estavam subindo. O médico chegou. Não tinha como eu chamar meu pai, se eu descesse, eles levariam minha mãe e o médico sumiria novamente. Conversei com ele sozinha. Minhas tias chegaram, minha mãe chorou ao vê-las e eu não pude ficar perto, acalmá-la pois estava ainda conversando com o médico. Eu disse a ele que meu pai estava lá embaixo e que queria falar com ele. Ele pegou o telefone, ligou lá e autorizou meu pai subir para UTI. Agradeci e voltei para ver minha mãe. Eles já estavam levando-a. A Eliane, muito gentilmente, permitiu que nós 3 a acompanhássemos até a UTI. Fomos conversando, acalmando minha mãe...
Ao chegar lá, a enfermeira pediu para que eu voltasse à enfermaria para pegar as coisas dela. Eu disse que faria isso depois.
- Tá bom. Então, enquanto isso, eu subo lá e ajunto tudo para você trazer, OK?
- Ótimo, obrigada.
Meu pai chegou. Entrei na UTI, avisei o médico que meu pai já estava lá e fui procurar minha mãe. Ela já estava em seu cantinho, bem acomodada e tranqüila. Conversamos um pouco, ela pediu que eu conversasse com a enfermeira da UTI para saber o que eu poderia levar para ela (xampu, cremes, sabonete...). (O médico ainda não havia saído para falar com meu pai.)
Subi para pegar as coisas na enfermaria. Ao abrir o armário dela, senti um cheiro muito forte de xixi. Comecei a procurar de onde ele estava vindo... era de uma camisola dela que estava enrolada lá dentro, toda molhada. Fiquei assustada porque isso significava que ela realmente passara muito mal... Conversei com a paciente da cama ao lado. Ela me contou o que havia acontecido. A coisa foi realmente feia, foi grave. Quando chegamos ela já havia melhorado bem. Ouvi aquela história, bastante preocupada mas não podia pensar muito. Corri à UTI porque ainda queria ouvir a conversa do meu pai com o médico. Mas, quando cheguei lá, eles já estavam terminando.
Entrei, guardei as coisas da mamãe, conversei com ela, consegui uma autorização especial para que meus tios se despedissem dela. Uma das minhas tias não quis entrar. Ela estava chorando muito, estava desesperada.
- Eu sabia que ela estava mal mas nunca pensei que estava desse jeito. Por que não vim antes, meu Deus? Ela está precisando muito da gente e eu nem sabia disso. Queria tanto ajudá-la.
Pois é...
Desci com ela para que se acalmasse, deixei-a lá no saguão e fui até o balcão para tentar encontrar o Dr. Richard, meu professor, meu anjo da guarda número 4. Eu precisava muito falar com ele, eu estava muito angustiada, precisava de algumas respostas, precisava de um pouco de atenção. Demorou até a mocinha localizá-lo pelo telefone. Nisso, meu pai já havia descido com meus tios e foi ver o que eu estava fazendo lá.
- Algum problema aí?
- Não. Só estou tentando localizar meu professor porque preciso falar com ele e sei que ele está aqui de plantão hoje. Você está com pressa de ir embora?
- Não. Faz o que você precisar fazer e depois vamos. Não tem problema nenhum.
Subi à UTI Cirúrgica onde ele estava (mais um lugar para conhecer). Timidamente entrei naquele lugar estranho e o vi, falando com um paciente. Esperei. Ele se virou, me viu.
- Oi, Paloma. Eu preciso muito falar com você. Você tem tempo? É que estou com um paciente infartando aqui e não posso falar agora. Você espera um pouquinho?
- Claro. Sem problemas.
- Tá vendo aquele corredorzinho ali? Então, entra lá, vira a esquerda, anda até o fundo e fica me esperando lá que já falo com você. Tem uma mala em cima da cama, abre ela e pega uns brigadeiros que estão num potinho... estão deliciosos.
Segui no tal corredor. No fundo havia um dormitório pequenininho mas confortável. Não entrei lá. Fiquei andando, esperando... Mas ele estava demorando muito. Desci para avisar meu pai e voltei para o tal corredor.
O Dr. estava correndo de um lado para outro, assinando papéis, fazendo pedidos às enfermeiras, tomando decisões...
Sentei em frente a uma janela e fiquei observando o movimento da rua e ouvindo a correria da UTI por um longo tempo. Até que o doutor apareceu.
Ele me levou até o dormitório, sentamos.
- Merece um prêmio por ter esperado tanto. Vou pegar um brigadeiro aqui na minha mala para você.
- Não, Richard. Obrigada mas eu não como doce.
- Como não come doce? Não sabe o que está perdendo... (Pausa). Como é que você está, Paloma? Como é que estão as coisas?
- Estou meio atordoada com tudo que está acontecendo. Não sei explicar. É desesperador...
- É... eu sei como é, já passei por situação muito semelhante...
E continuamos a conversar por quase uma hora. Foi maravilhoso. Ele me explicou tudo que eu queria saber, me deu detalhes sobre o caso, disse quais eram as possibilidades a partir daquele momento, me preparou para que se algo desse errado... Fiquei muito mais tranqüila. Um exemplo para eu guardar para o resto da vida: um médico bastante ocupado, dando plantão em pleno domingo de sol, pára todo serviço dele para gastar uma hora com uma garotinha, filha de uma paciente que nem é dele, só para tranqüilizá-la.
Ele ficou satisfeito de me ver melhor. Pediu para que eu descansasse o resto do dia porque no dia seguinte ele estaria no Barracão para me ajudar a estudar para a prova de terça.
Agradeci a atenção e o apoio. Desci para encontrar meu pai e meus tios e fomos embora. No caminho de volta para casa, vim contando para eles tudo que o Richard me falou para ver se eles se tranqüilizavam um pouco também.
À noite, liguei para Tina, amiga da minha mãe que estava indo todos os dias no hospital para me ajudar a cuidar dela. Ela ficou muito chateada de saber que minha mãe havia piorado e que não poderia mais passar tanto tempo com ela (na UTI, a visita só é das 16h às 17h).
Na segunda-feira, acordei cedo e fui para o barracão estudar. Encontrei meus amigos, nos esforçamos para descobrir as coisas sozinhos, até que cansamos... o Richard ligou, disse que tinha tido um problema mas que já estava indo nos encontrar, pediu para que esperássemos por ele.
Estudamos juntos até cansar. Aprendi algumas coisas mas sabia que eu precisaria estudar a teoria se quisesse tirar o 5,0 de que necessito para passar.
À tarde, lá para as 15:30h fui ao hospital ver minha mãe. Conversamos um pouco até que chegou um bando de enfermeiros dizendo que necessitavam fazer um exame nela e me pedindo para esperar lá fora. Saí. Esperei um pouco. Encontrei a Sandra, a psicóloga que acompanhava minha mãe e com quem eu sempre conversava.
- Como é que você está, Paloma?
- Estou bem, na medida do possível.
- Assustada com tudo isso, né?
- Muito!
- É... eu sei. Mas fica tranqüila. Eu conversei com sua mãe hoje, ela me pareceu bem mais consciente do que está acontecendo, ela sabe porque veio para cá e até brincou... disse "Pelo menos estou num lugar mais bonito.". Ela disse que gosta mais de ficar aqui na UTI, que dão mais atenção a ela, que a atendem prontamente quando ela chama.
- É, aqui eles se esforçam para fazer todas as vontades dela. E ela pegou um leito bem em frente ao corredor. Aposto que fica o dia todo acompanhando o corre-corre desse povo... Ela gosta dessa agitação.
- Bom, agora eu tenho que ir. Você vai vir amanhã? Gostaria de te ver, para conversarmos com mais calma.
- Eu estarei aqui em torno das 15h30.
- Ótimo. Então a gente se encontra nesse horário, amanhã, lá no balcão de enfermagem do 5º andar.
Ela foi embora. Eu fiquei em frente a porta da UTI mas o segurança começou a encrencar comigo dizendo que eu não poderia ficar ali onde estava, que eu deveria aguardar numa sala de espera no final do corredor. Disse a ele que eu não queria ir à tal sala de espera e que já que eu não podia ficar ali, esperaria lá dentro da UTI. Ele deu de ombros.
Quando entrei novamente, os enfermeiros já haviam se afastado, havia apenas a enfermeira responsável pelo leito que estava conversando baixinho com minha mãe e passando a mão em sua cabeça. Perguntei o que tinha acontecido, se já tinham feito o exame. Ela saiu, pediu para que minha mãe se acalmasse... Minha mãe, um tanto brava, me contou que não era nela que eles tinham que fazer o exame. Eles erraram o leito. Começaram a mexer nela e prepará-la mas chegou o médico e disse que eles estavam fazendo com a pessoa errada.
Fiquei um tempo conversando com ela, ela parecia estar com um pouco de falta de ar mas estava bem. Em determinado momento, ela disse que queria mudar de posição, que estava sentindo muita dor nas costas. Eu chamei a enfermeira... ela veio e muito cuidadosamente colocou minha mãe de lado. Mas, assim que ela saiu, minha mãe disse que não estava se sentindo bem. Perguntei o que ela tinha, se queria voltar para a outra posição, ela disse que não mas que estava mal. Fui atrás da enfermeira:
- Olha, ela está passando mal.
Ela saiu correndo e foi ver minha mãe. Voltou ela para a posição de antes levantou um pouco a cama, de modo que ela ficasse sentada e disse para ela ficar calma e respirar tranqüila que iria melhorar. Ela saiu. Minha mãe começou a reclamar dizendo que estava com muita dor nas costas e que ainda estava passando muito mal, eu disse para ela ficar quietinha, para não se mexer muito.
A Tina chegou, tentou conversar com minha mãe, tentou animá-la mas ela ainda estava mal. Fui atrás da enfermeira:
- Ela ainda está mal. Parece que está piorando.
A enfermeira foi atrás do médico e depois voltou para ver minha mãe. Tentou conversar com ela, acalmá-la até o médico chegar. Ele apareceu, ela falou que estava se sentindo muito mal mas que não sabia o que era, além disso estava com muitas dores. Ele a examinou, tentou conversar mas ela só ficou mais agitada. Ele pediu para que eu e a Tina saíssemos e o aguardássemos na sala de espera.
Saímos. Nessas alturas do campeonato, eu já estava desesperada também. A Tina pegou um copo de água para mim, conversamos, choramos, até que resolvemos voltar para a porta da UTI. Na mesma hora, o médico estava saindo para nos procurar. Conversamos bastante. Ele disse que ela estava com sinais de uma infecção que eles não sabiam exatamente onde e que isso estava causando a descompensação. Ele tentou explicar o máximo de coisas que conseguiu. E eu perguntei:
- Ela corre risco de morrer?
- Olha, o estado dela é bastante grave. Ela corre riscos sim. Mas faremos de tudo para combater a infecção e melhorar o estado dela.
Fiquei mais assustada. Voltei para vê-la. Ela já estava um pouco melhor. Já havia passado das 17h e a Tina não poderia mais ficar lá dentro da UTI. Eu disse a minha mãe que voltaria à noite para vê-la e saí com a Tina.
Saímos da UTI, o segurança chato já não estava mais lá. Paramos na frente para conversar. Ela disse que nunca havia visto minha mãe tão mal.
- Por que é que seu pai e seus irmãos não vieram visitá-la hoje?
- E eu que sei? Meu pai está em casa. Não sei porque ele não veio. Minha irmã e meu irmão estão trabalhando.
- Trabalhando? Mas eles podiam tirar uma folga para vir vê-la. A situação é grave, será que eles não percebem isso?
- Não sei. Eles dizem que não gostam de ver a mamãe mal
- Ah... e por acaso você gosta? Por acaso você acha que eu gosto? Claro que não. Mas estamos aqui. Precisamos dar apoio a ela.
- É... eu vou ligar para meu pai hoje e pedir para que ele venha amanhã. - Não consegui mais segurar e comecei a chorar.
- E pede para ele trazer sua irmã. Independente de qualquer outra coisa. Pode ser a última vez que ela vai ver sua mãe.
- Tá.
Ela me abraçou, ficamos ali chorando, esperando o elevador.
Descemos e fomos conversando até a porta da faculdade, onde eu entrei.
Guardei algumas coisas no armário e saí andando sem rumo pelo porão. Até que encontrei minha amigas, a Priscila e a Felicia, que estavam indo para Liga da Sífilis. Fui andando em direção a elas, abracei a Fê e disse que minha mãe estava mal, que ela ia morrer. Recomecei a chorar. Elas tentaram conversar comigo, sentamos, fiquei chorando um tempão, elas do meu lado, tentando me acalmar. Desencanaram de ir para a Liga.
Quando me acalmei um pouco, decidi ir ao orelhão telefonar para meu pai.
-Alô. Pai?
- Oi filha. Foi ver a mamãe? Como é que ela está?
- Ela tá mal, pai. Acho bom você vir vê-la e trazer a Jéssica.
Expliquei para ele o que o médico disse e meu choro voltou descontroladamente.
- Você está chorando, filha?
- TÔ!
- Calma. Tudo bem. Amanhã eu passo aí com sua irmã, tá? Agora fica calma e vai pra casa descansar.
(Depois descobri que meu choro assustou muito meu pai. Ele disse aos meus irmãos que se eu estava chorando é porque a coisa era grave mesmo... "porque ela já está acostumada a ver sua mãe mal" - como se desse pra acostumar com uma coisa dessas.)
Eu não queria ir pra casa. Voltei para onde as meninas estavam, continuei chorando por um tempo, tentei convencê-las de ir para Liga porque sabia que aquele dia era realmente importante. Elas não quiseram me deixar sozinha daquele jeito. Então, resolvi ir com elas para o PAMB, para a Liga. Eu não queria continuar lá chorando mesmo e seria legal ver outras pessoas. Fomos.
Entrei num consultório onde eles costumam guardar as mochilas, encontrei um pessoal da minha turma, deitei na maca e fiquei lá jogada, ouvindo as conversas que eu não entendia. Todos saíram para atender e para resolver outros problemas, fiquei deitada sozinha por um tempo mas já não estava mais chorando.
Resolvi voltar sozinha para faculdade, estava com muita fome. Mas, no caminho, encontrei a Iolanda conversando com outra pessoa, falei oi, dei um beijo nela e continuei andando. Eu queria falar com ela, queria que ela me consolasse com aquele seu abraço tão bom. Sentei na escada em frente à faculdade e fiquei lá esperando para ver se ela passaria. Até que ela apareceu.
- E aí, mocinha? Tá esperando alguém ou tá fazendo nada?
- Tô fazendo nada.
- Então vem cá comigo - ela fez um gesto para que eu desse a mão para ela.
Fomos até a sala, sentei numa cadeira e fiquei com uma amiga dela conversando sobre seus filhinhos. Depois, elas ficaram fofocando, falando várias coisas interessantes e confidenciais (que nem eu poderia saber...). Rimos bastante e logo saímos. Fui com ela até o carro.
No caminho, contei como estava minha mãe, tudo que tinha acontecido. Paramos em baixo de uma árvore e continuamos a conversa. Ela começou a chorar e me contou de uma situação semelhante que ela viveu há poucos anos. Me disse que nada nessa vida acontecia por acaso e que em algum momento eu teria que pensar porque é que tudo isso está acontecendo comigo.
- A maturidade que você tem hoje como estudante de Medicina não é comparável com nenhum aluno da sua turma, nem do 2º, nem do 3º, nem do 4º ano. Talvez se compare com um aluno de 6º ano, mas acho que nem isso. Tudo que você viu e viveu no hospital te trouxe uma visão muito mais real do que é a Medicina e como podemos usá-la para melhorar a vida dos nossos pacientes e de seus familiares. Com certeza, por tudo isso, você será uma médica muito melhor.
Ela me convidou para jantar na casa dela, disse que eu iria adorar conhecer seus filhinhos... Eu não podia, precisava voltar ao hospital para ver minha mãe.
Ao chegar de volta à UTI, minha mãe estava mal. A enfermeira estava com ela tentando explicar por que ela não poderia mudar de posição. Ela ainda estava com dores e com o mal-estar. A enfermeira saiu, conversei com minha mãe e ela disse que estava piorando. Fui atrás da enfermeira novamente:
- Ela está piorando. Acho melhor já chamar o médico.
Ela foi procurá-lo. Depois, veio ver minha mãe e disse que uma outra médica viria vê-la porque o médico dela tinha saído por um tempo. A médica veio, examinou, deu a conduta... ela não melhorou, a médica saiu, minha mãe falou para eu chamá-la de volta. Fiz isso, ela voltou, apareceu outro residente, os dois a examinaram novamente, prescreveram mais alguma coisa, tentaram sair e minha mãe os chamou novamente. Aí a médica sentou-se ao lado da cama e tentou acalmá-la, tínhamos que esperar um pouco para ver se as drogas seriam suficientes. Não foram.
Minha mãe ficou muito agitada, disse que ela nunca tinha sentido nada parecido com aquilo (que ela ainda não conseguia explicar o que era):
- Eu sei que não vou passar dessa noite. Vou morrer.
- Calma, dona Cecy. A senhora vai ficar bem. Não fala isso. Fica calma. - disse o residente.
- Paloma, você dá minhas coisas para Liu e...
- Pára mãe, não fala isso. Você vai ficar bem.
- Tá bom, mas promete que se eu for você vai dar minhas coisas para ela?
- Prometo. Agora fica quietinha, descansa, não fica falando.
Eu não a deixei continuar. Eu achei que ela não ia morrer. Sabia que ela estava mal mas não achei que fosse morrer. Ela queria me pedir outras coisas e eu não a deixei falar. Se arrependimento matasse... eu teria ido com ela.
Fiquei mais uma hora lá. Ela não melhorava. Ouvi a médica dizendo que achava que precisaria entubá-la. Já era tarde. Eu não queria continuar ali vendo aquilo. Foi demais para mim. Eu precisava descansar. Saí de lá cerca de 21h30, com a esperanças de que ela melhoraria, de que no dia seguinte ela estaria lá ainda.
Às 22h, ligaram para meu pai. Disseram que ela tinha piorado e que precisavam de um familiar lá. (Só fiquei sabendo dessa parte da história no dia seguinte.) Ele foi com meu irmão. Quando chegaram, ela já estava inconsciente, entubada... Não sei o que os médicos falaram, não sei o que houve... Eles voltaram para casa, meu irmão ficou chorando muito. Às 2h30 da manhã, ligaram novamente, ela havia falecido. Meu pai retornou ao hospital, para cuidar de tudo.
Na manhã de terça-feira, dia 9/12, acordei mais tranqüila porque ninguém tinha me ligado, ninguém me avisou nada. Eu achava que se acontecesse alguma coisa, me avisariam imediatamente. Me arrumei para ir à faculdade fazer minha prova - para a qual eu não havia estudado. Quando estava saindo, meu celular tocou.
- Paloma, onde é que você está. - era meu irmão.
- Estou na casa da vó. Estava saindo para ir para faculdade.
- Então, eu acho melhor você não ir não.
- Por quê? O que aconteceu?
Silêncio.
- Me fala. O que houve?
- Você já sabe... não sabe?
- Ah, não... ela morreu...
- É.
Comecei a chorar, ele me disse para esperar ele ligar porque iria me buscar para irmos para o velório, mais tarde.
Joguei minhas coisas no chão da sala, sentei no sofá, peguei o telefone e liguei para a Pri e para o Richard.
Depois, avisei a minha vó e fui para meu quarto. Fiquei lá deitada, chorando no escuro, um tempão. Minha vó veio, pediu que eu levantasse, disse que eu tinha que me conformar que eu não podia ficar daquele jeito. Eu briguei com ela, pedi para que ela me deixasse sozinha.
Quando consegui me recuperar, peguei no telefone, liguei para meu pai, depois para meu irmão. Eu não queria ficar em casa, queria ficar com meu pai.
Pela primeira vez na minha vida, deixei meu orgulho e minha vergonha de lado e comecei a ligar para várias amigas da minha mãe para pedir que viessem me buscar.
Consegui ajuda, sem muitas dificuldades.
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