Hoje, pela primeira vez, conversei com familiares de uma paciente sobre SPP.
Não sei como algumas pessoas conseguem conviver com um paciente diariamente e não se apegar, não se envolver. Isso me parece tão impossível... Você vê aquela pessoa todos os dias, vê ela dormindo, acordando, comendo, tomando banho, põe a mão nela (inclusive em partes íntimas) e consegue se distanciar? Esquecer depois que sai do hospital?
Essa minha paciente é daquelas que marcam mesmo, sabe? Ela tem algumas doenças graves (ainda é um mistério como uma pessoa pode ter tantas doenças graves ao mesmo tempo e estar viva), corre diversos riscos constantemente. Mas ela conversa, reclama, pede as coisas, se preocupada com cada medicação e cada horário, com cada exame, cada detalhe. Está totalmente lúcida, contactuante, orientada.
Mas tem um quadro grave.
Conversei bastante com a irmã dela (praticamente mãe) sobre as complicações que podem acontecer, sobre os riscos, os cuidados e o que fazer caso algo saia "errado". Foi uma das conversas mais emocionantes da minha vida. Como falar abertamente sobre algo tão profundo com alguém que você conhece há 10 dias? Como?
Acabei contando para ela da minha mãe, falei um pouco do que sofri e de como entendo o que ela está sofrendo agora. Mas, não sei porque, não consegui me livrar da postura de "eu sou a médica". Estive o tempo todo dura, ereta, fixa. Não consegui amolecer meu corpo. Estava com medo e prestes a desabar...
E tudo que queria depois era um abraço da minha amiga que estava de plantão à noite (sim, eu estava conversando com a irmã da minha paciente, após o horário do expediente - pior ainda, após receber uma notícia péssima em relação à evolução dela). Mas minha amiga não estava na hora em que saí do quarto. Depois ela reapareceu, mas não tive jeito de pedir um abraço... seria estranho.
Acabei extravasando meu sofrimento na comida... Claro... novamente. Apesar da minha atual diarréia, fui ao restaurante e comi tudo de mais gorduroso que tinha. Depois, me entupi de chocolate.
E não consegui chorar.
Dizem que tudo tem limite. Será que sofrimento também tem?
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